segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Ligações além mar


Por volta de 2003, uma grande amiga que trabalhava numa pequena casa espiritista no bairro do Estácio, desejosa de levar o estudo da Doutrina Espírita aos companheiros, nos convidou para ministrar um programa semanal de formação básica na Doutrina Espírita, às terças-feiras, usando como base o Evangelho Segundo o Espiritismo e O Livro dos Espíritos, e instrução aos médiuns da casa num segundo encontro, às quintas-feiras. Tínhamos aproximadamente duas horas de estudo em cada dia, o que proporcionou boa formação nos quase cinco anos de atividades com aquele grupo.

Tivemos oportunidade de estudar e tratar uma série de casos interessantes, que abordaremos ao longo do tempo nesse espaço virtual. Mas logo no início, antes mesmo de iniciarmos o estudo do Livro dos Médiuns ou de fornecer qualquer orientação aos médiuns, um casal de jovens, residentes na comunidade, nos procurou contando a seguinte história:

Ambos aparentavam 20 a 25 anos de idade, ela e ele, respectivamente. A jovem, que chamaremos de Glória, nos disse que já viveu com o rapaz, que chamaremos de Carlos, durante alguns anos. O relacionamento não deu certo, mas a amizade permaneceu, numa espécie de amor platônico, sem qualquer interesse carnal. Ela nos disse que vivia com sua mãe, doente mental com dificuldades de se locomover, e sua pequena filha, de outro relacionamento. Pediu orientação a fim de entender o porquê de Carlos ser tão próximo, inclusive cuidando com carinho e até dando banho em sua mãe, como se fosse a sua própria, desde a época em que viviam juntos. Disse também que a mãe se sentia muito calma na presença dele, mas que vivia tendo crises quando o casal convivia maritalmente.

A princípio, aquilo me sugeriu algo promíscuo, principalmente por serem eles habitantes de uma comunidade carente, onde a promiscuidade faz parte do meio. Puro preconceito da minha parte.

A equipe de trabalhadores era composta de diversos médiuns, sem qualquer formação, dando passividade a qualquer espírito sem nenhum critério ou conhecimento do mundo ao qual se relacionavam. Uma das médiuns, ao se aproximar do casal, começou a sentir-se mal, desandando a falar bobagens e a receitar isso e aquilo para afastar os maus espíritos. Como eu estava à frente dos estudos, aproveitei a ocasião a fim de prestar ajuda. A casa não tinha uma sala reservada às reuniões mediúnicas, sendo que as mesmas aconteciam à frente do público. Pedimos à médium que se sentasse, rogando aos demais companheiros que fizessem silêncio, sustentando as atividades que iriam ser iniciadas com o auxílio da prece.

Após a oração, rogando a Jesus seu amparo e da aproximação dos nossos benfeitores espirituais, um espírito manifestou-se, amparado por outro benfeitor, dizendo ser a mãe da jovem, vindo em desdobramento do sono. A princípio não nos disse muito, mas quando solicitamos a ajuda dos amigos espirituais a fim de despertar sua história, voltando ao passado, ela nos contou que em épocas remotas a Glória e ela eram irmãs, filhas de um nobre espanhol. Na época, eram amigas de um jovem, o Carlos, que pertencia a outro grupo familiar e que as cortejava desde crianças, sem promessas, mas permitindo que elas acalentassem o sonho de um casamento futuro. Embora muito unidas, eram adversárias quando se tratava do jovem mancebo.

A família do rapaz o enviou à França para estudos, prometendo que quando voltasse escolheria uma das moças como sua esposa. Ambas aguardaram esperançosas da vitória. O dia chegou, o rapaz voltou mais maduro e escolheu a Glória. No dia do casamento, a irmã preterida, sobe as escadas em pranto e atira-se pela janela do castelo, numa morte instantânea.

O espírito nos informou que o trio vem encarnando juntos em diversas oportunidades, numa tentativa de auxiliar a sua regeneração. Disse também que sua ligação com Carlos era muito grande e que não aceitaria que ele voltasse para a Glória ou que fosse embora.

Essa pequena, mas complexa história, demonstra que tudo podemos pelo livre arbítrio, mas que responderemos pela transgressão das Leis Divinas quando nossas atitudes interferirem na vida de outrem ou quando destruímos o santuário de carne dado por empréstimo, para a nossa evolução.

Provavelmente nosso amigo Carlos terá oportunidade de encarnar como marido da irmã suicida, recebendo Glória como filha, transformando essas energias malsãs que os ligam e fonte perene de amor.

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